Um Sopro de Vida

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Um Sopro de Vida
Um Sopro de Vida
Capa do livro Um Sopro de Vida (Pulsações) de Clarice Lispector.
Autor(es) Clarice Lispector
Idioma Português
País Brasil
Editora Brasil Editora Nova Fronteira
Lançamento 1978
Páginas 159
Cronologia
A Hora da Estrela

Um sopro de vida - Pulsações foi o último romance de Clarice Lispector. Escrito entre 1974 e 1977, foi publicado após a morte da autora em 1978. O modo como o romance foi construído remete a uma interrupção no processo de escrita do livro e denota que o mesmo só teria sido finalizado devido à morte de Clarice.

De acordo com Benjamin Moser (2009), Um sopro de vida - Pulsações começou a ser escrito por volta do ano de 1974. “Ela [Clarice] não viveria para vê-lo publicado. Quando morreu, restava uma montanha de fragmentos, mais tarde ‘estruturados’ por Olga Borelli.” O fato de ser póstuma dá a essa obra, por associação, a sensação de inacabamento. Como lembra Moser, o leitor pode se perguntar se o resultado final é exatamente o que a autora queria que fosse, pois o livro foi “não apenas publicado, mas também, em certa medida, escrito após a morte de Clarice”, tendo em vista o fato de que Olga Borelli, sua melhor amiga, organizou os pedaços e até retirou uma frase, como ela mesma admite, “para a família não ficar muito sofrida.” Nessa passagem, o autor pede a Deus que dê à personagem, Ângela Pralini, um câncer do qual ela não pudesse se livrar. Olga considerou que a família ficaria chocada com o coincidente fato de Clarice ter morrido de câncer.[1]

Embora tenhamos de considerá-lo em seu aspecto inacabado, no que diz respeito à maneira como foi estruturado e publicado, Um sopro de vida é exatamente o que a personagem, o autor-narrador que cria Ângela Pralini, prevê: “Este ao que suponho será um livro feito aparentemente por destroços de livro.”[2]

O romance[editar | editar código-fonte]

O livro apresenta um personagem anônimo, conhecido como "Autor", que por sua vez cria uma outra personagem, Ângela Pralini. Assim, a narrativa se alterna entre dois diários, um escrito pelo Autor e outro por Ângela.[3][4][5]

Após o enredamento reflexivo e hesitante das primeiras páginas, o narrador-personagem, posteriormente identificado como Autor, chega à conclusão de que terá de criar uma personagem. Adiantando que o único modo de salvar-se é “criar as próprias realidades.” O autor nos apresenta Ângela Pralini, a quem escolheu para que, através dela e de si, pudesse “entender essa falta de definição da vida.”.[2]

Ao nos anunciar a criação de sua personagem, o autor declara que seu livro “será um livro feito aparentemente por destroços de livro" através do qual pretende retratar “rápidos vislumbres” de si mesmo e de Ângela. Através de vários fragmentos, nos são apresentados os monólogos, em que, às vezes, parecem dialogar o autor e a personagem.[2]

O Autor, na tentativa de escrever uma história sobre Ângela, percebe que sua personagem acaba sobrepujando-o: “É preciso que me compreendam: eu tive que inventar um ser que fosse todo meu. Acontece porém que ela está ganhando força demais.”.[2]

Emancipada de seu criador, Ângela se torna o seu oposto, o seu não-eu. Neste processo de distanciamento entre autor e personagem, vemos o embate do sujeito que só alcança a si próprio quando consegue alcançar seu Outro: “Meu não eu é magnífico e me ultrapassa. No entanto ela me é eu”, escreve o Autor.[2]

O esvaziamento da narrativa[editar | editar código-fonte]

Um sopro de vida - Pulsações é um livro fragmentário tanto no aspecto formal quanto no fluxo narrativo, o romance é um exemplar da poética clariceana onde se encontram as principais questões literárias presentes na obra da autora. A questão da limitação da linguagem, a narrativa errante que deságua no fluxo de consciência e a relação entre autor, narrador e personagem são algumas dessas questões. Nesse livro, temos a história de um escritor que tateia no escuro premido pela falta de domínio sobre a linguagem e, posteriormente, sobre sua própria personagem. A aparente imperfeição e incompletude da obra, que transmite a sensação de uma escrita automática, passa a ser compreendida quando é feito o resgate do construto ficcional empreendido por Clarice desde sua primeira publicação.[6][7][8]

Considerando que a obra literária, na pós-modernidade, passa a ser concebida como algo em que as formas, o processo de criação e a construção da linguagem não se dão de maneira acabada, o texto literário baseia-se em uma espécie de revelação da construção da escrita. Entendemos que tal construção é resultado de uma busca por compreender uma verdade íntima, secreta e inatingível. Em Um sopro de vida, Clarice Lispector tenta alcançar essa verdade. O romance pode ser considerado um representante da busca da literatura pós-moderna, no sentido em que abrange pontos que denotam os caminhos através dos quais ela se dá: a inscrição de sujeitos (autor, narrador e personagem) que procuram sua verdade inatingível (procura que pode significar algo íntimo, e que, no entanto, revela a problemática da própria literatura que se volta para si, que se olha sem se reconhecer), a desconstrução da linguagem com o intento de dizer o indizível e a representação da figura do autor como produto, e não produtor, da escrita..[6][7][8]

Nesse sentido, o romance em questão não apresenta uma narrativa estruturada por meio de um roteiro organizado que nos conta uma história propriamente dita. O que podemos perceber é uma "esvaziamento" da própria narrativa..[6][7][8]

Referências

  1. Benjamin., Moser, (2009). Clarice : [uma biografia]. São Paulo: Cosac Naify. ISBN 9788575038444. OCLC 732618159 
  2. a b c d e Clarice., Lispector,. Um sopro de vida : pulsações. 1999, ©1978. Rio de Janeiro: Rocco. ISBN 9788532509482. OCLC 42774604 
  3. CASTELO BRANCO, Felipe. A ESCRITA DO ABISMO DE CLARICE LISPECTOR: MELANCOLIA E ANGÚSTIA. Corpo Freudiano do Rio de Janeiro - Escola de Psicanálise - Seção Rio de Janeiro/CFRJ
  4. DE SÁ, Olga. Clarice Lispector: a travessia do oposto. Págs. 199-239
  5. BERNARDET, Jean Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro: metodologia e pedagogia. Annablume, 1995, Págs. 82-90
  6. a b c HOMEM, Maria Lucia Stacchini Ferreira. No limiar do silêncio e da letra: traços da autoria em Clarice Lispector. Dissertação de Mestrado apresentada à área de Teoria Literária e Literatura Comparada da FFLCH/USP, sob orientação do Profa. Dra. Passos, Cleusa Rios Pinheiro, 2001.
  7. a b c MELO, Manoela Maria Alcântara. Da Ruína à criação: desmascaramentos da escrita em Um sopro de vida, de Clarice Lispector. 2013. Monografia (Licenciatura em Letras Plena) - Universidade Estadual Vale do Acaraú, Sobral - CE, 2013.
  8. a b c NUNES, Benedito. “Linguagem e silêncio”. In:______. O dorso do tigre. São Paulo: Ed. 34, 2009.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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